quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Para quês e porquês...

Dia 28.11.2008.
Vamos pressupor que existe uma sociedade pré-determinada em seu termo inicial, com raízes cravadas na civilização antiga, mesozóica e ditames impostos por milhares de anos atrás, ditames estes que ainda não possuíam regra per si mas viviam pela liberalidade e pelo instituto de sobrevivência, puro e nato dos animais irracionais e nós, racionais. Pressupõe que esta sociedade vivia sob o regime de imposição do livre arbítrio, da vontade própria e da não imposição de qualquer tipo de regime, sistema ou mesmo leis.

Com o passar do tempo, apesar de inúmeras assertivas entre os povos, esta mesma sociedade começou a sofrer com a desorganização, com a preocupação em sua essência do controle, da falta de algum alimento, de um bem perecível, de peles para vestuário e cabanas de moradia. Os jardins estavam sendo destruídos pela civilização que se modernizava; os campos estavam sendo cultivados; pastagens começaram a serem construídas para gados, cavalos e bezerros, porcos e galinhas começaram a ser domesticados para sustento próprio, para troca, para a necessidade de cada um. Surge o dinheiro, a contagem e o começo para a necessidade da organização.

E cada possui uma necessidade distinta; e cada um cultiva um produto diferente; e cada um tem uma especialidade, uma virtude que começara a ser aperfeiçoada com o tempo, com as vindas das dinastias, com as repercussões familiares e com as tradições. Surge os “porquês”, os “para quês” bem como os “quandos” os “ondes” e os “de quês”. Filósofos nascem em busca de respostas; as divindades e as crenças começam a serem difundidas no mundo; a necessidade de uma busca da razão para a nossa existência surge como ponto crucial totalmente marcante para a evolução humana, distinguindo-se das demais pelo descobrimento fiel e cabal do pensar e das possibilidades que poderiam ser criadas com os aperfeiçoamentos até então ditas como novidades, criadas tão unicamente pela capacidade humana da inteligência: única, infalível e inatingível. Surge a superioridade, a competição, os meios de comunicação a produção em massa, a industrialização e as revoluções industriais, guerra fria, divisão em oriente e ocidente, terceiro de segundo de primeiros “mundos”, capitalismo, socialismo, a tão profana raça pura, sem dizer na numerosa gama e diversidade de religiões.

E tudo isso para justificar o pressuposto inicial que deu origem a nossa espécie nesta terra. Por enquanto, os “porquês” e os “para quês” ainda não foram decifrados pela ciência e pelas religiões que foram impostas à nós pela sociedade antiga e pragmática. Fico estagnado com a situação sincera, pura e cruel que somos criados e impostos pela sociedade. E não me fale que você não sofre pela história e pelo retrocesso humano que nós mesmos criamos. E não me diga que você faz e pensa aquilo que bem entender, porque em seu íntimo, em seu cerne, em algum momento de sua mera existência você foi definitivamente atingido por esta sociedade e pela imposição, seja ela familiar, social ou religiosa. Em algum momento você foi sim definitivamente obrigado a fazer algo que não gostaria de fazer e tudo para o bem da tradição, dos dogmas impostos que serviram de exemplo a muitos anos, décadas e existências anteriores a nós.

E é justamente aí que enterramos de vez, a sete palmos do chão, a nossa busca, os nossos “porquês” e nossos “para quês”; enterramos também a nossa vontade imensa de descobrir o inatingível! Abro parênteses para uma pequena história totalmente relevante. Certa vez minha professora de literatura do colegial alertou a todos os alunos da classe com uma assertiva interessante: “- Quando somos bebes, estamos no topo de um fio de cabelo de uma cabeça imensa denominada “mundo”. De lá, tudo podemos, tudo enxergamos, tudo queremos. Somos atentos as novidades. Nossos instintos e nossos sentidos são totalmente aguçados. Cheiramos à tudo, vemos o além, escutamos o vazio e temos a capacidade até de vermos e enxergamos no escuro. De certo que, fato notório e inevitável, quando crescemos e viramos adolescentes, adultos, homens ou mulheres, somos obrigados a criar obrigações pela única justificativa da sobrevivência própria. O objetivo ficou simples: ou trabalhamos ou morremos! E começamos a, gradativamente, à descer aquele cabelo até a sua raiz, até onde ele brota, nasce e sai para o mundo. Começamos a escavar o crânio e a buscar coisas interiores, próprias para nós. Criamos o egocentrismo o individualismo e a persistência em vão de queremos sempre algo para nós mesmos que realmente não necessitamos. E você cava... cava... indefinitivamente... incansavelmente... e aqueles sentidos aguçados tornam especiais tão somente para você, e mais ninguém. Você está sozinho, em seu pequeno-grande mundo e ponto final!”

A sociedade faz justamente isso com nossos “bebes” internos, cada um sendo parte de um crescimento próprio e necessário: impede de expor realmente nossas opiniões, nossas idéias e até a possibilidade de crer em algo que é totalmente absurdo pelas outras pessoas. Ela consegue destruir a idéia que você cultivou a tanto tempo, com seus cuidados e zelo, como sse fosse um pequeno inseto, insignificante e sem objetivo algum. As regras que hoje são impostas e dilatadas pelos meios de comunicação são tantas que chego a ficar completamente atônito com o tamanho de bobagens anti-culturais que somos obrigados a escutar, mesmo que indiretamente. Estou espantado com o estilo de vida adotado pelas pessoas, pelo padrão e pela mesmice que fincou no olhar de cada ser humano. Olho para eles e vejo que os “porquês” e os “para quês” não servem para absolutamente nada! Acordam, levantam, trabalham, rezam e dormem. E ai de quem tentar mudar o estilo e a vida dogmática e confortável destes seres! Ai de você cutucar um sentimento visto como inquebrável no coração destas pessoas! Ai de você tentar pelo menos colocar um pingo de dúvida, um mero “talvez” em suas frases e a beleza de ter sempre a dúvida com o risco de receber assertivas cuspidas de forma cruel e grossa em sua cara. E se faz ou fala o oposto, é visto como "louco", como "sobrenatural" como "instintivo irracional "e "perspicaz" demais para o mundo atual.

Ainda bem que existem literários ótimos e peço aqui permissão para citá-los: “Todos nascem loucos; alguns permanecem” de Samuel Beckett e, ainda, “A loucura é o abismo da alma” de Antonin Artud.

Ainda bem que eu não faço parte deste mundo coerente, bonito, limpinho de idéias traçadas e com o destino já ditado por nossos ancestrais. Ainda bem que tenho meus ideais, firmes, fixos em meus sonhos e a capacidade ainda de expurgar de mim aquilo que não é realmente necessário, daquilo que é sujo, padronizado coeso e certo. Ainda bem que a capacidade de duvidar ainda permanece em meu peito que impulsiona diretamente as descobertas, as virtudes próprias e ao conhecimento do novo.

Ainda bem que pertenço ao mundo dos loucos, que sou visto como anormal, que carrego um motivo de existência, de permanência, de impulsão à ascensão, pontos estes que sempre são originários dos “para quês” e nos “porquês” que objetivam sempre ao ciclo infindável de conhecimento, da fuga constante de não ser suicidado pela sociedade que define meus ditames, meu caminho, meus passos e a lucidez de minha loucura.

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